O espectro abana o rabo: Stephen Crane, "O cão preto"

O poeta, novelista, contista e jornalista estadunidense Stephen Crane (1871-1900), reconhecido por críticos modernos como um dos mais inventivos de sua geração, era um apaixonado por cães. Uma de suas primeiras histórias, a primeira que enviou a um periódico para avaliação, foi sobre um garoto atacado por um urso e salvo por seu cão. O conto, “Jack”, acabou não sendo publicado, e apenas fragmentos sobreviveram. Mas os fatos a respeito de suas amizades caninas permaneceram.

Leia O cão preto, de Stephen Crane, em tradução minha.

Consta que ele e a esposa, Cora, em seus quatro anos de casamento, chegaram a ter cinco cachorros de uma só vez. Quando estiveram na Grécia, cobrindo a guerra dos Trinta Dias (1897, entre o Reino da Grécia e o Império Otomano) para o New York Journal — Cora é reconhecida como a primeira mulher correspondente de guerra —, resgataram um filhote perdido que foi imediatamente batizado de Velestino, o cão jornalista. Chegando a Atenas, Crane enviou ao jornal um artigo batizado “The Dogs of War” em que descrevia o resgate e seus desdobramentos. “Antes mesmo de chegar a Atenas”, escreveu Crane, “ele era facilmente o cão mais famoso da Grécia”. Velestino voltou com o casal à Inglaterra, onde moravam à época.

Um colega de faculdade lembrou, após a prematura morte do autor de O emblema vermelho da coragem, que, para Crane, “a reação instintiva de um cão a um humano recém-conhecido era prova infalível de caráter”. A Joseph Conrad, com quem travou amizade, dizia: “seu filho tem de ter um cão, um menino precisa ter um cão”.

“The Black Dog”, publicada originalmente em 1892 no New York Tribune, faz parte de um conjunto de contos humorísticos situados na região das montanhas Catskills no condado de Sullivan, Nova York, e estrelados por quatro personagens sem nome identificados apenas como “baixinho”, “gorducho”, “altão” e “calado” (os dois últimos, apenas figurantes neste conto). Embora fosse alegadamente admirador de ghost stories, Crane fez aqui uma paródia, satirizando, segundo alguns, as histórias de Ambrose Bierce.

Cães fantasmas, embora nem sempre pretos, são recorrentes na literatura de horror e mistério e no folclore de diversas regiões, com destaque para as ilhas britânicas, onde a variedade desses espectros – que atendem por nomes como Black Shuck, Hairy Jack, Church Grim e The Devil's Dandy Dogs, entre muitos outros – é impressionante. Lendas de cães pretos fantasmas em Dartmoor inspiraram sir Arthur Conan Doyle a criar uma das mais famosas aventuras de Sherlock Holmes, O cão dos Baskerville.

Leia O cão preto, de Stephen Crane, em tradução minha.

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